Rabiscos #33 - Pensamentos que não podem esperar
Fiquei algum tempo pensando no que escrever na Rabiscos de hoje, no meio deste feriado-ponto facultativo, de chuva, frio e gripe (ou resfriado? nunca sei bem a diferença).
Dias de folga são sempre esperados com expectativa - descanso, passeios, encontrar pessoas, ir à praia, ao cinema, a um show, cuidar das plantas, ficar sem fazer nada, maratonar uma série no streaming. Cada um aguarda este momento com querências distintas. Acho que ninguém considera a possibilidade de pegar um resfriado exatamente naqueles dias que estavam destinados ao lazer (ou, quem sabe, a corrigir trabalhos de estudantes, que se multiplicam como gremlins nesta época do semestre).
Expectativas foram criadas…. e foram quebradas. E aqui estou, esperando melhorar da coriza insistente. Com o mal estar, não me resta mais nada a não ser esperar.
Esperar nem sempre é fácil. Para mim é daquelas coisas quase impossíveis. Não que eu seja imediatista ou impaciente, muito pelo contrário. Mas sou do tipo “gente que faz” (só aqueles que conheceram o Bamerindus entenderão): penso, planejo e executo. Vejo pessoas que precisam das condições ideais de temperatura e pressão para qualquer movimento na vida e me espanto. O ideal só existe na filosofia ou na física teórica. O resto são condições nada ideais. E temos de lidar com elas.
Muitos passam a vida esperando para o momento certo, o qual nunca chega, e quando percebem, estão no final de seus dias e têm uma série de arrependimentos e frustrações. Acabam desenvolvendo nostalgia por aquilo que não vivenciaram, ou seja, querem o retorno de um passado que não aconteceu.
Sei que há momentos em que aguardar é o que temos para hoje, a coisa prudente a ser feita, o recomendável. Lembro que esperança vem da mesmo origem de esperar, e que ela pode estar ancorada numa atitude ativa e não passiva. Puxo Paulo Freire pra conversa, com sua proposta de esperançar.
Por outro lado, ouço pessoas mais velhas afirmarem que elas “não têm mais o que esperar da vida”, como se já tivessem vivido tudo o que seria possível viver. Eu sempre acho que ainda falta muito a viver, a descobrir, a conhecer, a provar, a sentir. Ainda há muito por vir. Como disse a escritora estadunidense Ursula Le Guin no livro Sem tempo a perder: reflexões sobre o que realmente importa (voltarei a ele em outras edições), “quanto mais longa for uma vida, uma parte maior dela será velhice”. Logo, precisamos encará-la como um tempo fecundo de possibilidades, ao invés de acharmos que não há mais o que esperar.
Talvez me angustie mais o contrário, saber que não vai dar tempo de viver tudo o que eu quero viver, porque nesse sentido não me satisfaço com o já vivido (o que não significa que não seja muito grata por tudo que experimentei e senti e vivi até aqui).
Ontem uma amiga me mandou a mensagem abaixo, que já circulou pela internet como tendo sido escrita por atores como Richard Gere, Anthony Hopkins e Keanu Reeves, Trata-se da junção de um texto produzido em 2015 por uma californiana chamada Nanea Hoffman, que mantém uma página no Facebook chamada Sweatpants & Coffee, com uma introdução acrescentada posteriormente por um anônimo.
Envelheci, mas meu coração continua jovem, sempre temos os mesmos anos na alma.
Eu sei que é a idade perfeita, todos os anos são especiais e preciosos.
Não se arrependa de envelhecer, é um privilégio que nem todos têm.
E tem toda a razão.
Nenhum de nós sairá daqui vivo,
então, por favor,
pare de se tratar como um pensamento tardio.
Coma a comida deliciosa.
Caminhe ao sol.
Pule no oceano.
Diga a verdade que você carrega
em seu coração como um tesouro escondido.
Seja gentil.
Seja estranho.
Não há tempo para mais nada.
Tanto Le Guin quanto Hoffman destacam a urgência do tempo mas também a sua seletividade. “Pare de se tratar como um pensamento tardio”. No original, afterthought, pode ter dois significados: 1. : an idea occurring later (uma ideia que ocorre tardiamente; reflexão tardia). 2. : something (such as a part or feature) not thought of originally : something secondary (algo - como uma parte ou recurso ) não pensado originalmente: algo secundário.
O que significa para você parar de se tratar como um pensamento tardio?